Da série Confissões
Normalmente, não sonho. Dizem que se sonha todos os dias, mas nem sempre restam lembranças. Não sei. Acho que sonho pouco. Dos sonhos bonitos, lembro alguns. Há os emocionantes, também. O que não esqueço são os pesadelos. Por que é que a gente tem de lembrar mais o que é ruim?
Com o trânsito, por exemplo, tenho pesadelos constantes. Vejo-me dirigindo, agarrada ao volante, perseguida por outros carros em alta velocidade. Só sei que tenho de pisar fundo e fugir. Parece aquele jogo de videogame que simula uma pista de corrida. Tenho horror àquilo, não jogo nem sob tortura. Acordo assustada e, de vez em quando, tenho a mesma sensação quando estou na rua de verdade.
Outro pesadelo é acordar no meio da noite achando que estou deitada em água. Desperto apalpando o colchão. Comecei a ter esse sonho desde que me mudei para Natal. Talvez porque nunca tenha visto tanta umidade na minha vida. Sou bicho de cerrado, terra seca. O inverno aqui é de chuva por três ou quatro meses. Então, às vezes tenho esse sonho: estou de novo no porão da Polícia Federal, onde fiquei presa por 24 horas, numa cela com uma cama de alvenaria, contígua à parede e pintada com tinta a óleo.
Sem cobertura, colchonete ou manta, era fria como o diabo. Com o chão inundado, o que esfriava ainda mais o ambiente, passei a noite sobre a tal cama de tijolo, acocorada, com medo de pôr os pés no chão por conta dos insetos que infestavam o local. Pois eu acordo com a impressão de que estou naquela celinha alagada. Tenho de tatear ao redor até perceber que estou na minha cama, seca e limpa.
Mas o pior de todos os sonhos é com insetos. Especificamente baratas. Tenho fobia a esse bicho. Aliás, horror a qualquer bicho, mas essa coisa pré-histórica é de arrepiar, de se jogar pela janela. Por conta desse maldito animal, nem consegui ler direito A Metamorfose, do Kafka. Eu começava a leitura e tinha engulhos, foi uma dificuldade. Nos meus pesadelos, vou à cozinha ou a outro cômodo da casa e encontro uma barata imensa. E ela, parada, começa a crescer até ficar do tamanho de um urso. É de acordar gritando.